Engaiolada (22.07.2020)
Reservo-me
a ousadia da ficção. Da primeira pessoa. Chamo aquela ideia de que não é
literatura por ser íntima. Chamo para desconsiderá-la. Obedeço a magia
que intui seivas com a lua. Como por exemplo os trocadilhos sertões. Lua Nova. Pneu do carro furado na estrada de noite escura com chuva. Muitas mudas no porta-mala. Agricultura regenerativa.
Peço
ao estado de poesia possibilidade de chegar numa escrita encantada
sobre a cantoria de pássaros. Sem som. Reservo-me à
“liberdade é fazer
tudo errado”, como disse minha amiga Ju. Quero mostrar fotos. Uma
colagem amadora e subjetiva. Engaiolada.
Cobro-me dominar o
linguajar acadêmico. Aquele das palavras e estudo. Especismo. Dizer ser
entender que não hierarquizemos nossa relação com as espécies. Todas
elas. Grande assim o leque. Quando expandi essa ideia enfrentei em mim a
liberdade.
Meu pai, meu avô tinham pássaros em gaiolas. Uns que
pendiam sempre para o amarelo. Talvez canários? Canarinhos? Livinha
ganhou de presente uma piriquita. Amarela. Chamou-a Pamonhinha.Vai criar
solta. Desejei recentemente ter um papagaio. Atiçada pela agudeza da
inteligência do bicho. Preenchida com a troca. Um bicho de pena tão
perto. Fala. Textura fora do pêlo. De susto a galinha sempre se joga pra
morte. O brinco que me fiz de
galinha-da-angola. Pra descobrir
que poderia quem sabe estar despistando a morte. Ainda se me permite com
experiência, a coleção de penas,
mania de catar o que se despende leve
da terra. E partindo agora do que observei do homem e o pássaro.
Passa por essa história que me despertou decisão. Houve uma tentativa
de assassinato perto de nós: acerto de contas de pássaros. Fez-se
tocaia. Tocaia Grande nunca li e me observo como alerta. Vale dinheiro
obviamente.
Quero tanto trazer fôlego ao que escrevo. E pra
cantar se expande fôlego? Nunca cantei, sou suspendida.
Pássaro me respira. A animação
mitológica em ÍCARO. Eu grito de susto. Tô aprendendo a sonhar voando. O céu é o maior precipício que conheço.
Mas todas manhãs os vejo
desfilar com suas gaiolas e passeando como troféus, em riste. Vai pegar
um sol? Vai cantar? Vai botar ele mais perto do céu? O Pássaro.
Indefensáve!!
E o que noto é toda essa dança que se faz com a
natureza. Tem esse livro “O bem viver” de Alberto Acosta. De onde leio
procurando responder como desfaço a separação . E as arapucas que tem
outro nome. A arapuca da educação determinista. Aqui quase rezo. Daí-me
aceitar a liberdade sabendo problematizá-la... criatura de todo
conflito. Desenvolvimento destrutivista. O peito estufado para ser
anti-capitalista feito cínica em causa própria. Sim, pelo fim do mundo.
As vítimas maritacas em Ilhéus perdendo sua árvore enquanto perdemos a alma. Morre-se de exaustão em terra colonizada.
Uma
imagem que desejo fazer: todos eles com seus pássaros, muitos e juntos na estrada de chão. A
infinidade mil dessa ideia. Como quem coleciona a curiosidade. Eles
guardam pássaros em gaiolas.